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DIREITO DOS NEGÓCIOS E TEORIA DOS JOGOS


I - INTRODUÇÃO
Um negócio é uma atividade desenvolvida com o intuito de se gerar lucro, utilizando-se de informações, tecnologia, transações comerciais, promovendo a circulação de capital e serviços, nos mais diferentes ramos e em variados setores.
Ao longo de toda a sua história o homem tem se valido do processo de conhecimento, para implantar uma atividade fim que possa ser vantajosa para ele e para os seus semelhantes. Desta forma, podemos dizer que a atividade negocial está intimamente ligada ao processo de conhecimento.
O aprendizado e a aplicação da razão nas atividades cotidianas, com intuito de resolver os problemas, de longa data tem sido o fator primordial para determinação do sucesso de qualquer empreendimento.
O homem natural, nos termos do que estabeleceu Jean Jacques Rousseau para parametrização de seus estudos sobre a sociedade, sempre teve que enfrentar desafios para sobreviver e garantir a preservação de sua espécie.  Importante destacar aqui que não será tratado o tema ético, sobre o processo de corrupção do homem à medida em que foi se afastando de seu estado natural. Trataremos aqui de um homem que usou da sua capacidade de perfectibilidade, de aperfeiçoamento e adaptação para vencer seus oponentes e obstáculos.
O homem se distingue dos animais, segundo Rousseau, pela liberdade e pela perfectibilidade, sendo que a primeira se dá pelo fato de que é livre para escolher de acordo com a razão, enquanto os animais somente agem por instinto. A segunda, por sua vez, consiste na capacidade de adaptação às necessidades, ou uma potência de transformação efetivada pelas circunstâncias. O homem é capaz de aumentar a quantidade de seus comportamentos, incorporando novos, ou mesmo modificando antigos, ou seja, tem a capacidade de adquirir conhecimentos.
Sobre esses aspectos assim se posiciona J.J. Rousseau[1]:
A metalurgia e a agricultura foram as duas artes cuja invenção produziu essa grande revolução. Para o poeta, foram o ouro e a prata; mas, para o filósofo, foram o ferro e o trigo que civilizaram os homens e perderam o gênero humano. Tanto um como o outro eram desconhecidos dos selvagens da América, os quais, por isso, sempre ficaram como tais; os outros povos parece mesmo que continuaram bárbaros enquanto praticaram uma dessas artes sem a outra. E uma das melhores razões, talvez, por que a Europa foi, se não mais cedo, pelo menos mais constantemente e melhor policiada de que as outras partes do mundo, é que ela é, ao mesmo tempo, a mais abundante em ferro e a mais fértil em trigo. 
(...)
Quanto à agricultura, o seu princípio foi conhecido muito tempo antes da sua prática estabelecida, e não é possível que os homens, sem cessar ocupados em tirar sua subsistência das árvores e das plantas, não tivessem bastante prontamente a ideia dos caminhos que a natureza emprega para a geração dos vegetais. Mas, sua indústria só se voltou, provavelmente, muito tarde para esse lado, ou porque as árvores que, com a caça e a pesca, proviam à sua nutrição, não tinham necessidade dos seus cuidados, ou por não conhecerem o uso do trigo, ou por não terem instrumentos para o cultivar, ou por falta de previdência em relação à necessidade futura, ou, finalmente, por faltarem os meios para impedir os outros de se apropriarem do fruto do seu trabalho. Tornados mais industriosos, pode-se acreditar que, com pedras agudas e paus pontudos, começaram cultivando alguns legumes ou raízes em torno das suas cabanas muito tempo antes de saberem preparar o trigo e de terem instrumentos necessários para a cultura em grande escala: sem contar que, para se entregar a essa ocupação e semear a terra, é preciso se resolver, primeiro, a perder alguma coisa para ganhar muito em seguida: precaução que estava muito distante do expediente do homem selvagem, que, como já disse, tinha muita dificuldade em pensar de manhã nas necessidades da noite.
O homem é capaz de adquirir conhecimento, mas não se tem certeza até então, de como se dá o processo de conhecimento.
Os racionalistas, tais como René Descartes, Baruch Spinoza e Gottfried Wilheim Leibniz, defendem que o processo de conhecimento se trata de uma operação lógica instaurada através da razão que é inata.
Os empiristas, como John Locke, David Hume, Thomas Hobbes e George Berkeley, defendem que o conhecimento se dá através da experiência, que fornece os dados para que se empregue o método indutivo que irá constituir a razão.
Durante muito tempo os empiristas e racionalistas disputaram com seus fundamentos para lograr êxito em explicar o processo de conhecimento, até que Immanuel Kant, através da chamada revolução Kopernicana da Filosofia, estabeleceu com seu criticismo um método parte racional e parte empírico. Na metafísica Kantiana parte do conhecimento se dá com a experiência, que possibilita a formulação dos juízos, que por sua vez somente são possíveis pela existência da razão, que é parte dos seres humanos. Desta forma, conhecer as coisas somente é possível através da experiência e desde que tenhamos os pressupostos, ou seja, as condições necessárias e suficientes para conhecer o objeto, para poder formular nossos juízos, ou seja, estabelecer nosso conhecimento.
Não à despeito do brilhante trabalho realizado pelos filósofos, com sua imensa capacidade de abstração há a necessidade de se empregar o conhecimento na prática de soluções para os problemas da vida. O homem é um ser social, seja por sua fragilidade, ou por qualquer outro motivo que possa estar descrito no Leviatã de Thomas Hobbes, sob o fundamento de que o homem é o predador do próprio homem, no Contrato Social de Jean Jacques Rousseau, sob o fundamento de que a sociedade protege o mais fraco ao passo que também o corrompe, ou nos Tratados Sobre o Governo de John Locke, obra que nos permite destacar:
Nor was this appropriation of any parcel of land, by improving it, any prejudice to any other man, since there was still enough and as good left, and more than the yet unprovided could use. So that, in effect, there was never the less left for others because of his enclosure for himself. For he that leaves as much as another can make use of does as good as take nothing at all. Nobody could think himself injured by the drinking of another man, though he took a good draught, who had a whole river of the same water left him to quench his thirst. And the case of land and water, where there is enough of both, is perfectly the same[2]. (Segundo Tratado de Governo, capítulo V, §33)
O fato é que o homem se constituí naturalmente em sociedade e não há como impedir que, assim como o homem, a sociedade que é fruto de suas atividades cotidianas também se modifique, evolua e até mesmo se corrompa. Não há como dizer que a sociedade, como fruto da humanidade que é, não traga consigo as mesmas mazelas.
Assim, podemos estabelecer que a sociedade se modifica fazendo com que os conceitos e as atividades, assim como a forma de pensar, possam se tornar obsoletos. Novamente faz-se a ressalva de que não tem cunho ético este estudo, portanto aqui não se tratará de investigar sobre o bem ou o mal da evolução do pensamento do homem e de sua aplicação na sociedade.
Feitas as devidas ressalvas, temos que as atividades e o pensamento podem se tornar sem efeito na vida, o que podemos explicar melhor, quando tomamos o exemplo do fogo. Na idade das cavernas saber fazer fogo era algo que poderia determinar a vida ou a morte, algo que supria as necessidades imediatas de calor, de cozimento de alimentos, bem como de segurança contra animais que eram afugentados pela luz, além de iluminação. Atualmente “saber fazer fogo” não é algo que daria alguma vantagem a alguém, exceto em situações extremas, que fogem do objeto.
Outro exemplo que pode ser levado em consideração é o maravilhoso invento de Johannes Gutenberg que viabilizou a revolução da imprensa por volta de 1450. Este mecanismo permitiu a difusão da cultura e do conhecimento, tornando-o mais democrático e acessível com o tempo. Apesar de sua imensa contribuição, atualmente, não há mais motivos para utilização de impressões, que foram substituídas quase que totalmente pela mídia digital, a partir do advento da internet.
 Desta forma, temos que as atividades humanas, bem como suas ciências, como é o direito, modificam-se ao longo do tempo para que seja possível atender os anseios da sociedade.
II - DA MODIFICAÇÃO DO DIREITO PARA OS NEGÓCIOS
O direito se modificou muito ao longo dos anos, principalmente no que diz respeito ao direito corporativo. Atualmente há a necessidade de se planejar minuciosamente as operações de uma empresa, para que esta não se separe da lei.
Não se pretende estabelecer que o direito é positivo ou natural, ou qualquer outra corrente, mas apenas partir do preceito de que à medida em que a vida em sociedade é uma realidade e uma exigência e que esta está submetida a um conjunto de normas, não há o que fazer senão atuar em estrito cumprimento da lei.
Neste momento é que a aplicação do direito se torna um desafio, porque a intenção de quem estabelece um negócio, qualquer que seja, não é outra senão obter lucro. De outro lado, a lei não permite que qualquer atividade seja desenvolvida, bem como proíbe a prática de certas condutas, consideradas abusivas ou nocivas, ainda que dentro de uma atividade lícita.
A competitividade faz com que o negócio dependa de planejamento, que pode ocorrer sob vários aspectos, como por exemplo a escolha da atividade, o local de realização, o tipo societário mais adequado, o regime tributário, a forma de contratação de empregados, entre outros tantos. A escolha da atividade remete a um conjunto específico de leis que a regulamentam, que podem variar dependendo do local e do tipo societário, que poderá inclusive determinar o regime tributário e assim por diante.
Desta forma, a aplicação do direito tornou-se um jogo onde concorrem certezas, incertezas, riscos e probabilidades. Um empreendimento que opta pelo simples, por exemplo, pode eventualmente perder vantagem competitiva quando começar a crescer, tendo que modificar o regime e enfrentar certa instabilidade.
Importante acrescentar que as leis não se tornaram autoaplicáveis e interdisciplinares, o que se modificou no direito, não foi este em si, mas a sua aplicação, ou seja, quem se modifica é o advogado, o juiz, o auditor, o contador, entre outros que se destinam à atividade jurídica.
Não que falte dinamismo à lei, coisa totalmente plausível e elemento indispensável à sociedade, que podemos exemplificar citando o marco da internet e o casamento homo afetivo, mas o que mais exige mudança é a postura do profissional do direito.
O profissional jurídico que não conhecer de negócios, não irá mais atuar na área empresarial, porque a necessidade do empresariado é outra, não mais se resumindo a direito do trabalho, direito societário, direito tributário e direito civil, entre outros ramos.
O advogado de contencioso de massa será certamente substituído por um programa de computador, como por exemplo, o “Watson”, criado pela IBM e capaz de prestar serviços jurídicos sem a intervenção humana.
Apesar da criação de robôs cada vez mais autônomos e capazes de grandes feitos, o advogado não será substituído se também evoluir. Desta forma, poder-se-á questionar qual o “upgrade” que o advogado deverá fazer para não ser obsoleto no mercado.
Para ser competitivo o advogado, além de compreender as matérias jurídicas dentro de uma interdisciplinaridade, o advogado do futuro deverá conhecer os negócios em suas peculiaridades e por fim, empreender em práticas que viabilizem estabelecer o procedimento de decisão.
III – DA APLICAÇÃO DA TEORIA DOS JOGOS
Partindo-se do preceito de que o advogado, por exemplo, já tem conhecimento em diversas áreas do direito e que conhece os negócios para os quais pretende prestar seus serviços, o destino é aplicação da teoria dos jogos ao direito.
A teoria dos jogos trata de situações estratégicas nas quais os jogadores escolhem diferentes ações para alcançar seus objetivos. Apesar da estratégia ser algo utilizado desde os primórdios da humanidade, o estudo de teorias para utilização no processo de tomada de decisão somente tomou corpo no século XX. Tornou-se um ramo da matemática com a publicação “The Theory of Games and Economic Behavior” de John von Neumann e Oskar Morgenstern. A teoria dos jogos encontrou grande abrigo na economia, principalmente por sua capacidade de aplicação a temas complexos, como é o caso do mercado financeiro, onde o resultado não depende da estratégia do operador e das condições do mercado, mas também das escolhas dos demais operadores e de elementos externos, tais como acidentes, ou outros casos fortuitos.
A teoria dos jogos pode ser aplicada a qualquer processo de tomada de decisão, desde os mais simples, inclusive para fins de entretenimento, como o que ocorre com alguns videogames, como também para os aspectos mais significativos, como o processo decisório de uma grande corporação internacional.
Para se ter uma ideia a teoria dos jogos é utilizada inclusive por biólogos no estudo da evolução das espécies.
O exemplo mais emblemático utilizado para explicar a teoria dos jogos é o “Dilema do Prisioneiro”, apresentado pelo matemático Albert W. Tucker, que propõe o seguinte:
·         Dois suspeitos, A e B, são presos pela polícia.
·         A polícia tem provas insuficientes para os condenar, mas, separando os prisioneiros, oferece a ambos o mesmo acordo:
a)   se um dos prisioneiros, confessando, testemunhar contra o outro e esse outro permanecer em silêncio, o que confessou sai livre enquanto o cúmplice silencioso cumpre 10 anos de sentença.
b)   Se ambos ficarem em silêncio, a polícia só pode condená-los a 6 meses de cadeia cada um.
c)    Se ambos traírem o comparsa, cada um leva 5 anos de cadeia.
·         Cada prisioneiro faz a sua decisão sem saber que decisão o outro vai tomar, e nenhum tem certeza da decisão do outro. A questão que o dilema propõe é: o que vai acontecer? Como o prisioneiro vai reagir?
Desta forma, temos a seguinte tabela de ganhos:

Prisioneiro “B” nega
Prisioneiro “B” delata
Prisioneiro “A” nega
Ambos são condenados a 6 meses
“A” é condenado a 10 anos; “B” sai livre.
Prisioneiro “A” delata
“A” sai livre; “B” é condenado a 10 anos
Ambos são condenados a 5 anos.

A escolha de um depende diretamente do resultado da escolha do outro, o que faz com que o dilema do prisioneiro seja muito semelhante aos casos reais e cotidianos.
A representação dos jogos pode ser formal ou extensiva e os tipos podem ser assimétricos e simétricos, soma zero e soma diferente de zero, simultâneos e sequencial, informação perfeita e informação imperfeita, jogos duradouros ou rápidos, entre outros e inclusive os desmembramentos que podem ter, que são inúmeros.
Os jogos podem ser aplicados na economia e nos negócios, na biologia, na ciência da computação, na ciência política, na filosofia e inclusive no direito.
Como exemplo de utilização da teoria dos jogos no direito, podemos apresentar a escolha de um mandado de segurança, em detrimento de uma ação declaratória, a opção por uma tese de que há afronta a Constituição Federal, pela prática de certa conduta pela autoridade. Note-se que a análise da viabilidade de se alegar uma inconstitucionalidade cabe ao advogado, porque não há um rol de condutas contrárias a Constituição Federal a ser seguido. Também não há como prever que a defesa será apresentada de forma insuficiente para rebater a tese albergada. Pode ser que os argumentos lançados na defesa sejam irrefutáveis, ou pode ser que determinado juiz, para quem a ação foi distribuída, tenha entendimento totalmente contrário ao expressado na inicial. Todos estes aspectos são variáveis a ser estudadas que colocam o direito suscetível da aplicação da teoria dos jogos.
Diante da diversidade que se apresenta em face das questões jurídicas, o profissional do direito não tem outra opção senão capacitar-se para atuação no direito da inteligência dos negócios.
Um caminho a ser percorrido consiste no do aprofundamento na teoria dos jogos e a análise de casos jurídicos pontuais, aplicando-se os conceitos apreendidos.
IV - DO DIREITO DA INTELIGÊNCIA DOS NEGÓCIOS
Dentro do contexto aqui delimitado, mas não restrito a estes breves fundamentos, temos que o direito da inteligência dos negócios é o conjunto de leis reguladoras da atividade negocial, bem como de sua fiscalização, além das relações jurídicas estabelecidas entre os “players” do mercado.
Temos que a atividade jurídica na seara do direito da inteligência dos negócios consiste na análise do contexto legal inerente à atividade desenvolvida, sob o prisma da inteligência negocial, ou seja, otimizando as operações sem que haja desobediência das leis, visando o lucro e o desenvolvimento.
Assim, o profissional da área de inteligência de negócios trabalha na construção do conhecimento jurídico. As leis têm a finalidade de regulamentar os atos e fatos da vida, ou seja, o direito é uma consequência da vida em sociedade, tal como salientado acima. Por exemplo, o instituto da compra e venda surgiu para determinar o ato pelo qual alguém entrega um bem a outro tendo como contrapartida o pagamento de um valor correspondente em moeda. Deste fato jurídico temos que a compra e venda é regulamentada e possui inclusive uma forma contratual, também designada pelo direito, para que as avenças entre as partes ficassem pré-determinadas e pudesse haver a oposição ou cobrança pelo descumprimento.
Partindo-se para um exemplo mais complexo podemos citar o caso das sociedades anônimas, que oriundas das relações comerciais do século XVII, como consequência das grandes navegações, surgiu para que fosse possível explorar uma atividade comercial à distância. Mais tarde, pelo fato de que as ações das sociedades anônimas podiam ser livremente comercializadas, foi estabelecida uma bolsa de valores mobiliários, onde os títulos passaram a possuir valor próprio, vinculado à atividade desenvolvida pela empresa e seu desempenho nos negócios. As leis caminharam juntamente com o desenvolvimento do mercado até que se chegasse no modelo atual.
O direito da inteligência dos negócios é uma realidade que toma corpo a cada dia como um sistema autônomo, que não se confunde com o direito empresarial. O direito empresarial é um ramo do direito privado, que consiste no conjunto de normas disciplinadoras da atividade do empresário, o que remete aos problemas com ações trabalhistas, execuções fiscais, ações cíveis, ambientais, entre outros, como os oriundos dos procedimentos aduaneiros.
Quando se estabelece que a inteligência de negócios está aliada ao direito está-se tratando de estratégia jurídica e neste momento podemos mais uma vez fazer a conexão do direito com a teoria dos jogos, porque é através de ferramentas como esta que são determinados os rumos jurídicos que o negócio irá tomar.








[1] ROUSSEAU, Jean-Jacques. A Origem e os Fundamentos da Desigualdade entre os Homens. Tradução: Maria Lacerda de Moura. Edição Ridendo Castigat Mores. Versão para eBooksBrasil.com, disponível em file:///C:/Users/arthur.achiles/Downloads/ROUSSEAU,%20J.J_Discuros%20sobre%20a%20origem%20da%20desigualdade_Ed%20RCM.pdf
[2] LOCKE, John. Second Treatise on Civil Government. Chapter V, § 33.

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