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GOVERNANÇA JURÍDICA ADUANEIRA



I - INTRODUÇÃO
A palavra governança significa o ato ou processo de governar, governo, governação. Esta atividade, que foi inspirada no controle que exerce a administração pública sobre seus órgãos, surgiu para a esfera privada por conta da necessidade de maior transparência e confiabilidade nas informações que uma empresa presta aos seus acionistas, investidores e ao mercado.
A ideia de uma gestão mais eficaz tomou corpo a partir dos escândalos contábeis que ocorreram nas empresas Enron e WorldCom, nos Estados Unidos da América.
 A empresa Enron Corporation era uma companhia do ramo de energia, atuante na distribuição de eletricidade, gás natural, além de atuar também em comunicações. O seu faturamento chegou a atingir 101 bilhões de dólares no ano de 2000, mas acabou decretando a falência em 2002. Durante anos os diretores da empresa vinham forjando a contabilidade, maquiando balancetes, enxugando prejuízos e inflando os lucros, provocando assim um aumento no valor das ações e a volátil alegria dos acionistas. A empresa agia em conluio com a auditoria Arthur Andersen e o Governo Americano abriu dezenas de investigações criminais contra executivos. Muitos acionistas e investidores de Wall Street foram lesados por estas práticas, o que gerou uma enorme intolerância com atividades fraudadoras.
A empresa WorldCom atuava no ramo de telecomunicações e também foi instrumento de uma fraude bilionária. Neste caso, a diretoria determinava o registro de bilhões de despesas com custos de linha, como gastos com investimentos e não como despesas operacionais, inflando os lucros e aumentando – até a descoberta da fraude – largamente o valor das ações. A WorldCom pediu concordata após o reconhecimento da fraude bilionária, dezenas de empregados foram demitidos, os acionistas e investidores tiveram prejuízos gigantescos.
Estes casos pontuais não foram os únicos, porque a fraude na contabilidade era uma prática comum, numa época onde não havia a obrigatoriedade da governança corporativa. Uma das medidas adotadas pelo governo americano para impedir a prática de fraudes nas empresas, foi a edição da Lei Sarbanes-Oxley (Sarbanes-Oxley Act), assinada em 30 de julho de 2002 pelo Senador Paul Sarbanes e pelo Deputado Michael Oxley. Esta Lei garante a criação de mecanismos de auditoria e segurança confiáveis nas empresas, incluindo regras para a criação de comitês para supervisionar atividades e operações, mitigando os riscos e principalmente, atuando para evitar as fraudes ou identificar sua ocorrência.
A partir da adoção das práticas de governança corporativa, as multinacionais, constatando que os procedimentos realmente eram capazes de auferir maior segurança e confiabilidade aos negócios, trataram de difundir a prática no mundo inteiro, espalhando a política de boas práticas e condutas a todas as partes do mundo.
A governança corporativa é constituída pelo conjunto de processos, costumes, políticas, leis, regulamentos e instituições que regulam a maneira como a empresa é dirigida, administrada e controlada, visando a ética e a transparência das relações negociais, sob a égide dos seguintes princípios:
Ø  Disclosure (transparência): divulgação dos dados de forma sistemática;
Ø  Fairness (equidade/justiça): tratamento igualitário entre sócios minoritários e majoritários;
Ø  Accountability (prestação de contas/consistência): veracidade e adequação dos balanços financeiros.
Ø  Compliance (respeito à lei): adequação dos procedimentos jurídicos internos e externos;
A governança é pautada pela participação de todos, pelo respeito ao estado de direito, a transparência na realização de atividades, responsabilidade com a sociedade, orientação pelo consenso, igualdade e inclusão social, eficiência nos processos com foco nos objetivos e, por fim, uma atividade de prestação de contas capaz de dar suporte a atividade fiscalizadora. Possui amplas abordagens e pode ser aplicada a inúmeros ramos de atividade, sob diversos aspectos, por conta das peculiaridades de cada um.
No sentido jurídico a governança é atribuída a um conjunto de práticas legais e utilização de ferramentas jurídicas, no intuito de resolver problemas que a empresa possa ter ou vir a ter, por conta de atividades que possam ir de encontro com a lei. Não é raro encontrar empresas que desconhecem a lei e agem da forma que melhor lhes convém de acordo com o bom senso. Apesar de sua boa-fé, as empresas não estão seguras, ou seja, não são imunes à aplicação de penas, que por sua severidade, podem decretar o fim das atividades. Outra ocorrência que habitual é o fato da empresa conhecer a lei, mas não saber como implementar os procedimentos, ou como se adaptar a ela, o que também a coloca numa situação de fragilidade e suscetível a duras penalidades.
Sob o aspecto da governança jurídica, a empresa deverá se obrigar ao cumprimento das leis, normatização das políticas internas e redução de riscos, com a finalidade de evitar ocorrência de prejuízos econômicos, a perda de receita e o aumento de ações judiciais, além de sanções de natureza criminal e danos à reputação da empresa.
A governança jurídica também pode ser aplicada de forma preventiva (due dilligence), inclusive para a busca de soluções jurídicas para os desafios empresariais e serem enfrentados por fatores econômicos, sociais, negociais, entre outros.
São muitas as formas de governança jurídica que podem ser aplicadas às empresas, tais como a governança jurídica trabalhista, criminal, tributária, comercial, ambiental, econômica, etc.
Neste artigo vamos nos ater às práticas de governança jurídica aduaneira, ou seja, sob os aspectos da governança, aplicada a modalidade jurídica e à espécie aduaneira.
II – GOVERNANÇA JURÍDICA ADUANEIRA
A governança jurídica aduaneira consiste no conjunto de procedimentos de gestão empresarial com o objetivo de que se adote as melhores práticas, a fim de coordenar e revisar os procedimentos aduaneiros, ou seja, as operações da empresa com relação às atividades de comércio exterior.
II.1 - Objetivos
Os objetivos da implantação de uma governança jurídica aduaneira são, além da maximização do lucro, o respeito e o cumprimento das obrigações aduaneiras, na obediência dos procedimentos determinados pelo Regulamento Aduaneiro – Decreto 6.759, de 05 de fevereiro de 2009, bem como da legislação esparsa instruções normativas, bem como de outras normas específicas eventualmente aplicáveis a cada atividade peculiar respectivamente. Também são objetivos o planejamento das operações e aconselhamento para redução do grau de risco e com fundamento no propósito negocial, além do gerenciamento dos riscos aduaneiros e tributário-aduaneiros, de modo a visar o alívio da carga tributária através da utilização de regimes especiais de importação/exportação e atuação preventiva.
A governança jurídica aduaneira é capaz de promover um estreitamento do relacionamento com as autoridades fiscais, demonstrando a honestidade e a licitude dos procedimentos, devidamente registrados e realizados na forma da lei, numa conduta proativa, capaz de facilitar o controle da fiscalização.
Outro objetivo que pode ser alcançado é a obtenção de benefícios através de programas de incentivo à produção e às operações, tais como o Drawback e o RECOF-Sped.
Além disso, a empresa através de um processo de controle e regularização estritamente de acordo com as normas, afasta de sua rotina eventuais processos administrativos abertos por irregularidades, autuações por interposição fraudulenta, cargas apreendidas, perda da licença para atuar em comércio exterior, ou até eventual cassação do CNPJ.
II.2 – Obtenção de regime aduaneiro especial
Uma das vantagens de se implantar a governança aduaneira é a possibilidade de através dos processos de regulação e controle, tornar a empresa passível de habilitação em regime que confere uma vantagem competitiva.
Os regimes aduaneiros, estabelecidos nos artigos 307 a 503 do Regulamento Aduaneiro, são destinados a empresas que comprovam as boas práticas, favorecendo seus titulares com benefícios fiscais tais como isenção e suspensão parcial ou total de tributos.
São regimes aduaneiros especiais passíveis de obtenção atualmente no Brasil os seguintes:
Ø  Admissão temporária: o regime aduaneiro especial de admissão temporária é o que permite a importação de bens que devam permanecer no País durante prazo fixado, com suspensão total do pagamento de tributos, ou com suspensão parcial, no caso de utilização econômica (artigos 353 a 382 do Regulamento Aduaneiro e IN RFB 1600 de 14/12/2015);
Ø  Exportação temporária: o regime de exportação temporária é o que permite a saída, do País, com suspensão do pagamento do imposto de exportação, de mercadoria nacional ou nacionalizada, condicionada à reimportação em prazo determinado, no mesmo estado em que foi exportada (artigos 431 a 448 do Regulamento Aduaneiro e IN RFB 1600 de 14/12/2015);
Ø  Trânsito aduaneiro: o regime especial de trânsito aduaneiro é o que permite o transporte de mercadoria, sob controle aduaneiro, de um ponto a outro do território aduaneiro, com suspensão do pagamento de tributos (artigos 315 a 320 do Regulamento Aduaneiro e IN SRF 248 de 25/10/2002);
Ø  Drawback: o regime de drawback é considerado incentivo à exportação, e pode ser aplicado nas seguintes modalidades: suspensão - permite a suspensão do pagamento do Imposto de Importação, do Imposto sobre Produtos Industrializados, da Contribuição para o PIS/PASEP, da COFINS, da Contribuição para o PIS/PASEP-Importação e da COFINS-Importação, na importação, de forma combinada ou não com a aquisição no mercado interno, de mercadoria para emprego ou consumo na industrialização de produto a ser exportado; isenção - permite a isenção do Imposto de Importação e a redução a zero do Imposto sobre Produtos Industrializados, da Contribuição para o PIS/PASEP, da COFINS, da Contribuição para o PIS/PASEP-Importação e da COFINS-Importação, na importação, de forma combinada ou não com a aquisição no mercado interno, de mercadoria equivalente à empregada ou consumida na industrialização de produto exportado; restituição - permite a restituição, total ou parcial, dos tributos pagos na importação de mercadoria exportada após beneficiamento, ou utilizada na fabricação, complementação ou acondicionamento de outra exportada (artigos 383 a 403 do Regulamento Aduaneiro, IN RFB 845/2008, IN RFB 168/2002, IN RFB 81/1998, Ato Declaratório COSIT 16/1999, Ato Declaratório COSIT 20/1996, Portaria Conjunta RFB/SECEX nº 1.618/2014, Portaria RFB/SECEX 467/2010 e Portaria Conjunta RFB/SECEX 03/2010);
Ø  Entreposto aduaneiro: o regime especial de entreposto aduaneiro na importação é o que permite a armazenagem de mercadoria estrangeira em recinto alfandegado de uso público, com suspensão do pagamento dos impostos federais, da contribuição para o PIS/PASEP-Importação e da COFINS-Importação incidentes na importação (artigos 404 a 419 do Regulamento Aduaneiro e IN SRF 241, de 06/11/2002);
Ø  Recof: o regime de entreposto industrial sob controle aduaneiro informatizado - RECOF é o que permite a empresa importar, com ou sem cobertura cambial, e com suspensão do pagamento de tributos, sob controle aduaneiro informatizado, mercadorias que, depois de submetidas a operação de industrialização, sejam destinadas à exportação (artigos 420 a 430 do Regulamento Aduaneiro
Ø  Recof-Sped: o Recof-Sped permite a empresa beneficiária importar ou adquirir no mercado interno, com suspensão do pagamento de tributos, mercadorias a serem submetidas a operações de industrialização de produtos, partes ou peças, destinados à exportação ou ao mercado interno (IN RFB 1612 de 26/01/2016).
Ø  Repetro: o regime aduaneiro especial de exportação e de importação de bens destinados às atividades de pesquisa e de lavra das jazidas de petróleo e de gás natural – REPETRO (artigo 458 a 462 do Regulamento Aduaneiro e IN RFB 1415 de 04/12/2013);
Ø  Repex: o regime aduaneiro especial de importação de petróleo bruto e seus derivados - REPEX é o que permite a importação desses produtos, com suspensão do pagamento dos impostos federais, da contribuição para o PIS/PASEP-Importação e da COFINS-Importação, para posterior exportação, no mesmo estado em que foram importados (artigos 463 a 470 do Regulamento Aduaneiro, artigo 93 do Decreto Lei 37/1966 e IN SRF 05 de 10/01/2001)
Ø  Reporto: o regime tributário para incentivo à modernização e à ampliação da estrutura portuária - REPORTO é o que permite, na importação de máquinas, equipamentos, peças de reposição e outros bens, a suspensão do pagamento do imposto de importação, do imposto sobre produtos industrializados, da contribuição para o PIS/PASEP-Importação e da COFINS-Importação, quando importados diretamente pelos beneficiários do regime e destinados ao seu ativo imobilizado para utilização exclusiva em portos na execução de serviços de carga, descarga, movimentação de mercadorias e dragagem, e na execução de treinamento e formação de trabalhadores em Centros de Treinamento Profissional (artigos 471 a 475 do Regulamento Aduaneiro e IN RFB 1370 de 28/06/2013)
Ø  Loja Franca: o regime aduaneiro especial de loja franca é o que permite a estabelecimento instalado em zona primária de porto ou de aeroporto alfandegado vender mercadoria nacional ou estrangeira a passageiro em viagem internacional, contra pagamento em moeda nacional ou estrangeira (artigos 476 a 479 do Regulamento Aduaneiro, Portaria MF 112/2008 e Portaria MF 307/2014);
Ø  Depósito especial: O regime aduaneiro de depósito especial é o que permite a estocagem de partes, peças, componentes e materiais de reposição ou manutenção, com suspensão do pagamento dos impostos federais, da contribuição para o PIS/PASEP-Importação e da COFINS-Importação, para veículos, máquinas, equipamentos, aparelhos e instrumentos, estrangeiros, nacionalizados ou não, e nacionais em que tenham sido empregados partes, peças e componentes estrangeiros, nos casos definidos pelo Ministro de Estado da Fazenda (artigos 480 a 487 do Regulamento Aduaneiro e IN SRF 386 de 14/01/2004);
Ø  Depósito alfandegado certificado: o regime de depósito alfandegado certificado é o que permite considerar exportada, para todos os efeitos fiscais, creditícios e cambiais, a mercadoria nacional depositada em recinto alfandegado, vendida a pessoa sediada no exterior, mediante contrato de entrega no território nacional e à ordem do adquirente (artigos 493 a 498 do Regulamento Aduaneiro e IN SRF 266 de 23/12/2002);
Ø  Depósito franco: o regime aduaneiro especial de depósito franco é o que permite, em recinto alfandegado, a armazenagem de mercadoria estrangeira para atender ao fluxo comercial de países limítrofes com terceiros países (artigos 499 a 503 do Regulamento Aduaneiro, artigo 93, do Decreto-Lei 37/1966, artigo 14 da Lei 10.865/2004, IN SRF de 19/04/2001 e IN SRF 448 de 06/09/2004)
Apesar de cada um destes regimes possuir requisitos para aprovação da habilitação e finalidade diferentes, não há como afirmar que as empresas que se submetem para qualquer deles não passará por uma verificação completa para comprovação da idoneidade das informações prestadas.
A verificação da empresa não irá se ater simplesmente a documentação apresentada, mas ao propósito negocial e à comprovação das condições mínimas necessárias e suficientes para cumprimento das obrigações a serem assumidas pela concessão de eventual regime aduaneiro especial.
Além da comprovação da regularidade fiscal, as empresas deverão submeter sua escrituração contábil e fiscal para apreciação, além de contratos, extratos de contas correntes, informações sobre ativos, licenças quando exigidas por lei, além de quaisquer outros documentos que forem solicitados para comprovação da idoneidade das informações prestadas a RFB.
II.3 – Do Programa do Operador Econômico Autorizado
As operações de comércio exterior, ao longo de toda sua história, tornaram-se cada vez mais recorrentes e complexas, com o envolvimento de diferentes sistemas jurídicos e de controle do trânsito internacional de mercadorias. Apesar dos esforços na fiscalização, sobre a movimentação de pessoas, mercadorias e serviços, a preocupação também aumentou, por conta da prática de atividades ilícitas. Surgiu então a necessidade da realização de um melhor controle das operações envolvendo personalidades além-fronteiras, para evitar males como o tráfico de entorpecentes, de pessoas, sonegação fiscal, lavagem de dinheiro, contrabando e, principalmente terrorismo, entre outros.
Esta iniciativa sempre foi algo tido como estritamente necessário, mas ganhou impulso somente após o atentado ao World Trade Center. Desde então, os Estados Unidos tomaram a frente na busca pela segurança da cadeia de suprimento internacional, com a instituição do C-TPAT – Customs Partnership Against Terrorism, baseado no conceito “The Stairway”, da aduana sueca. Este também foi aproveitado para a criação do programa OEA europeu, que é base para o programa brasileiro.
Neste contexto, a partir de 2005 foi desenvolvido um projeto pela Organização Mundial da Aduana (WCO – World Custom Organization), que teve como fundamento inicial facilitar o comércio e combater o crime em todo o mundo. Assim, iniciaram-se os estudos sobre como implementar medidas para dinamizar os fluxos de trabalho das aduanas, o que resultou no “Safe Framework of Standards”, que se trata de uma série de premissas e princípios que norteiam a atividade aduaneira.
No Brasil estes conceitos, de acordo com o “WCO Safe Framework of Standards” foram implementados pelo Programa do Operador Econômico Autorizado, mais comumente chamado de Programa OEA. Esta estrutura garante integração entre faz aduanas dos países, aduana e empresas e, aduana e outras agências de governo, para maior agilidade e facilidade na gestão e segurança das cadeias logísticas.
O programa, no entanto, é recente no Brasil, tendo sido instituído pela IN RFB 1521 de 04 de dezembro de 2014, mas atualmente encontrando-se regulado na IN RFB 1598 de 08 de dezembro de 2015.
II.3.1 – Sobre o Programa de Certificação
O programa OEA consiste na certificação dos intervenientes na cadeia de comércio exterior brasileiro, atestando sua boa prática, tanto no que tange à segurança, quanto ao atendimento de suas obrigações perante a aduana. A implementação do OEA no Brasil assegura, desde sua implementação, maior facilidade na assinatura de acordos comerciais com outros países, facilitar a integração e a realização de práticas comerciais legítimas, tornando o país um destino cada vez mais confiável para a realização de investimentos. Além disso, o programa traz segurança para as operações de comércio exterior, porque inclusive contribui para o aprimoramento dos controles aduaneiros, através da gestão de riscos.
Nos termos do que dispôs o artigo 3º da IN RFB 1598 de 08 de dezembro de 2015, os objetivos programa são proporcionar maior agilidade e previsibilidade no fluxo do comércio internacional, buscar a adesão crescente de operadores econômicos, inclusive pequenas e médias empresas, incrementar a gestão de risco das operações aduaneiras, firmar acordos de reconhecimento mútuo que atendam aos interesses do Brasil, implementar processos de trabalho que visem à modernização da aduana, intensificar a harmonização dos processos de trabalho com outros órgãos regulatórios do comércio exterior, elevar o nível de confiança no relacionamento entre os operadores econômicos, a sociedade e a Secretaria da Receita Federal do Brasil e considerar a implementação de outros padrões que contribuam com a segurança da cadeia logística.
A implementação do Programa Brasileiro de OEA foi feita em três fases:
1ª OEA Segurança, pelo qual a certificação é dada com base em critérios de segurança, destinado aos exportadores em geral, implementada a partir de 10 de dezembro de 2014;
2ª OEA Conformidade, destinado à importação, cuja certificação é dada com base no cumprimento de normas e procedimentos aduaneiros;
3ª OEA Integrado, destinado tanto aos processos de importação e importação, mas com a integração de outros órgãos tais como a ANVISA e a VIGIAGRO.
O programa em sua segunda fase, confere a faculdade de se optar pela modalidade OEA Pleno, que consiste na certificação conjunta como OEA Segurança e OEA Conformidade.
No mês de setembro de 2015 a Receita Federal já anunciava as primeiras empresas a receber a certificação de Operador Econômico Autorizado. No dia 14 de dezembro deste mesmo ano, era lançada a segunda fase, OEA Conformidade, anunciando-se o fim e a absorção do “Linha Azul”, a partir de 1º de março de 2016. A RFB facultou às empresas que eram beneficiadas por este regime, a possibilidade de transição para o OEA Conformidade, bastando que se fizesse até a data limite, a solicitação de abertura de dossiê digital de atendimento, instruído com solicitação de certificação provisória, através de formulário específico para a transição e, cópia do ADE de habilitação à linha azul.
Com o lançamento da segunda fase o RECOF (Regime Aduaneiro de Entreposto Industrial sob Controle Informatizado) passou a ser um regime meramente suspensivo de tributos, facultando às empresas deste regime a possibilidade de certificação OEA Conformidade.
No dia 26 de abril de 2016 a equipe responsável pela implantação do Programa OEA se reuniu com representantes do Ministério da Agricultura - VIGIAGRO, dando continuidade à execução de implantação da terceira fase. A partir de outubro de 2016 começaram as tratativas para realização de planos de trabalho conjunto com outros países, tais como Rússia, China e Estados Unidos da América.
Como podemos observar, as medidas têm a finalidade de fortalecer o comércio, principalmente porque coloca à mostra quais são os intervenientes das operações de comércio exterior que agem total e estritamente dentro da lei. Tal certificação estabelece uma maior confiança, tanto entre os particulares entre si quanto na relação destes com o poder público.
Essas medidas, sem dúvida, têm o cunho de elevar o Brasil ao que poderíamos chamar de Classe A do comércio internacional, podendo inclusive, pelo sucesso de sua implantação, obviamente, reduzir os custos de operação, principalmente quando inerentes ao risco assumido e prazos para cumprimento.
II.3.2 – Benefícios Garantidos ao Operador Econômico
Os operadores econômicos poderão usufruir de vantagens logísticas e competitivas, além de efetiva redução de custos, como por exemplo os benefícios da assinatura de acordos de reconhecimento mútuo, utilização de canal direto de comunicação entre com a Receita Federal para esclarecimento de dúvidas e uso da marca do programa. Poderão ainda usufruir da vantagem de ter apenas um reduzido percentual de cargas selecionadas para os canais de conferência, além de ter prioridade no processamento, no caso de eventual seleção. Além disto, estarão dispensados de exigências na habilitação ou aplicação de regimes aduaneiros especiais, que já tenham sido cumpridas no procedimento de certificação do OEA.
Podem ser certificados como OEA os importadores e exportadores, depositários de mercadoria sob controle aduaneiro, operador portuário e aeroportuário, transportadores, despachantes aduaneiros e agentes de carga, nos termos do que trata o artigo 4º da IN RFB 1598/2015.
O Programa OEA possibilita a certificação do operador nas modalidades “Segurança – OEA-S”, “Conformidade - OEA–C” e “Pleno – OEA-P”. O primeiro se dá com base em critérios de segurança aplicados à cadeia logística no fluxo das operações de comércio exterior, enquanto o segundo, com base em critérios de cumprimento das obrigações tributárias e aduaneiras e, possuindo critérios diferenciados em dois níveis, vinculados aos respectivos benefícios concedidos. Por fim, o último tipo de certificação, ocorre pela união das modalidades anteriores.
Os procedimentos para certificação estão dispostos principalmente na Instrução Normativa RFB nº 1598/2015, onde constam os requisitos e as modalidades para obtenção, que sumariamente estão listados da seguinte forma: auto avaliação, formalização da solicitação de certificação, exame dos requisitos de admissibilidade, análise de conformidade, certificação, manutenção e monitoramento.
Neste ínterim, há que se destacar que para a obtenção da certificação, existe a necessidade de se tomar as devidas cautelas, porque a empresa será, de certa forma, exposta a um procedimento rigoroso de avaliação.
II.3.3 – Importância da Governança Jurídica Aduaneira
Para a certificação na modalidade segurança, por exemplo, avalia-se, nos termos do que dispõe o artigo 6º da IN RFB 1598/2015, o controle de unidades de carga, controle de acesso físico, procedimentos de segurança em geral e treinamento em segurança e conscientização de ameaças, além da segurança física das instalações. Como se pode observar, sem a realização de uma devida auditoria na área de segurança, previamente ao pedido de certificação, há a possibilidade grande de fracasso, sem falar na possibilidade de averiguação de irregularidades sujeitas à penalização.
Da mesma forma, quando tratamos da modalidade conformidade, aconselha-se a procura de auxílio de profissionais qualificados para avaliar as chances de êxito e até mesmo buscar soluções para eventuais problemas. Nesta modalidade, nos termos do que dispõe o artigo 7º da IN RFB 1598/2015, avalia-se todo o sistema de contabilidade e registro fiscal da empresa, a política de verificação documental e o controle de estoque, a descrição das mercadorias, capacitação e desenvolvimento, classificação fiscal, apuração da base de cálculo dos tributos e do preço das exportações/importações, cumprimento de normas relativas a regimes especiais e aplicados em áreas especiais, suspensões, isenções, regras de origem e rastreabilidade de mercadorias. Todas as operações da empresa deverão estar literalmente à mostra, portanto há necessidade da realização de uma consultoria junto a profissionais qualificados, que poderão verificar previamente a adequação.
Apesar de aparentemente ser algo trabalhoso e burocrático, diversas empresas estão aderindo ao programa e usufruindo as vantagens da certificação como um atestado público de confiabilidade. Desta forma, podemos concluir que a atividade de comércio exterior está cada vez mais, sendo restringida àqueles que não destoam suas atividades, do que determinam os preceitos legais, ou seja, agir corretamente, atualmente, não se trata de apenas um dever, mas de uma extrema necessidade.
II.4 – Autuações por Interposição Fraudulenta
As empresas que trabalham com comércio exterior têm enfrentado alguns problemas, algumas vezes por falta de uma orientação adequada, outras vezes por um certo exagero por parte da fiscalização.
Não a despeito da gravidade das apreensões de carga, determinações de devolução da mercadoria ao estrangeiro, aplicações de multa e demorados procedimentos de fiscalização, entre outras questões, neste artigo tratar-se-á da questão da interposição fraudulenta, que muitas vezes poderia ser resolvida por um planejamento adequado, nos termos do que determina o propósito negocial.
Qualquer problema na operação, que facilmente poderia ser resolvido, acaba sendo considerado “interposição fraudulenta”, o que poderia ser evitado, com a aplicação de regras de governança.
Considera-se interposição fraudulenta a operação de comércio exterior, na qual a empresa, na importação ou na exportação, oculta o real vendedor, comprador ou responsável pela operação, através de fraude.
A definição utilizada para se caracterizar a interposição fraudulenta vem do Decreto-Lei 1455, de 07 de abril de 1976, que serviu de base para a redação do artigo 689, XXII, do Regulamento Aduaneiro, Decreto 6759, de 05 de fevereiro de 2009.
A interposição é o ato ou efeito de interpor-se, ou seja, o ato de colocar-se entre algo, ou intervir como mediador. No caso das operações de comércio exterior, o sujeito que pratica a interposição fraudulenta, coloca-se indevidamente, através de fraude ou simulação, como interveniente numa operação de importação ou exportação, para ocultar o verdadeiro agente. Esta ocultação pode ocorrer por diversos motivos, tais como impedir o conhecimento da origem dos recursos utilizados, ou possibilitar que pessoa inabilitada para as operações possa atuar, burlando as orientações do regulamento aduaneiro.
A interposição fraudulenta ocorre se o verdadeiro importador, por exemplo, estando inapto para realizar suas operações, por não ter agido corretamente, se une com importador devidamente habilitado, que realiza a operação como para se fosse para ele.
Outras hipóteses comuns para a interposição fraudulenta, se tratam de operações realizadas com intuito driblar a carga tributária, ou lavar dinheiro de atividades criminosas.
Para a consumação do ato ilícito de interposição fraudulenta é necessário a comprovação ocultação e a prova da atividade irregular, pela a utilização de pessoa interposta na relação de comércio exterior, no intuito de dificultar a real identificação do responsável pela infração ao Sistema Tributário Nacional, nos termos do que dispõe a Lei nº 8.137/90, e/ou ao Sistema Financeiro Nacional, de acordo com o que prevê a Lei 9.613/98.
Nos casos de interposição fraudulenta, a pena aplicada será de perdimento da mercadoria, conforme disposição do Regulamento Aduaneiro, nos termos do artigo 689, XXII, além da possibilidade de declaração de inaptidão da pessoa jurídica, no caso do artigo 801 do mesmo diploma.
Apesar de ter o cunho de identificar e penalizar aqueles que se utilizem de operações de comércio exterior para obter vantagem manifestamente indevida, mediante fraude, simulação, ou outro meio ilícito, o instituto vem sendo utilizados deveras vezes, para realização de uma devassa fiscal na empresa.
Muitas vezes ocorre uma simples falta de etiqueta na mercadoria, ou de alguma informação, mas a fiscalização imediatamente declara guerra contra e empresa, impedindo a liberação da mercadoria, exigindo toda a contabilidade, contratos sociais, entre outros documentos, tais como contrato de câmbio.
Importante acrescentar que a empresa tem o dever de fiscalizar suas próprias atividades e desenvolver procedimentos de fiscalização e controle de modo a evitar ocorrências indesejadas.

A constatação de interposição fraudulenta por parte da empresa enseja inclusive responsabilidade criminal, portanto é imprescindível que se tome as devidas medidas de forma preventiva, para que a estruturação das importações não dê margem a interpretação das operações como ato fraudador.

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