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ASPECTOS RELEVANTES DA ANÁLISE SOBRE PREÇOS DE TRANSFERÊNCIA NO BRASIL

  

Desde 2018 o Brasil vem desenvolvendo juntamente com a OCDE o Projeto Preços de Transferência no Brasil, com o objetivo de identificar e avaliar os pontos fortes e pontos fracos da estrutura de preços de transferência no país, para que este possa ser definitivamente alinhado aos padrões internacionais determinados pelos três principais instrumentos da OCDE, que são a Recomendação do Conselho da OCDE de 1995, a Recomendação do Conselho de 2008 sobre a atribuição de lucros a estabelecimentos permanentes e a Recomendação de Preços de Transferência BEPS de 2016.

 

O estudo, trazido a público pela OCDE em 03 de agosto de 2020, foi desenvolvido em 03 etapas: 1) Análise preliminar do quadro jurídico e administrativo das regras de preços de transferência no Brasil; 2) Avaliação dos pontos fortes e fracos das regras de preços de transferência e práticas administrativas existentes; 3)  Opções para alinhamento com as normas de preços de transferência internacionalmente aceitas da OCDE.

 

Após analisar o material apresentado foi desenvolvido este estudo para tentar compilar e explicar o conteúdo abordado.

 

O sistema de preços de transferência do Brasil, estabelecido em 1996, foi desenvolvido com base no Relatório da OCDE do ano de 1979, ou seja, nasceu deveras defasado.

 

Não bastasse, o sistema brasileiro de conferência de preços não evoluiu significativamente desde a sua instituição, deixando de acompanhas as revisões das orientações da OCDE, que tiveram suas orientações revisadas significativamente com a publicação das Diretrizes da OCDE de 1995. Estas diretrizes foram sendo atualizadas e clarificadas regularmente, tendo suas principais atualizações acontecido em 2010 e 2017.

 

A mudança mais significativa decorreu do Projeto BEPS (Base Erosion and Profit Shifting). As Ações 8 a 10 desde documento abordaram formas de combater e limitar abusos, ou seja, impedir a elisão tributária por meio de práticas de preços de transferência.

 

O sistema brasileiro de preços de transferência foi identificado como precário, por conter várias lacunas e divergências significativas, quando comparado ao modelo atual do sistema da OCDE.

 

A defasagem encontrada na legislação sobre preços de transferência no Brasil é prejudicial, tanto para os contribuintes, quanto para a justa arrecadação dos tributos, porque além de dar origem à dupla tributação, torna o país vulnerável à erosão da base tributável na transferência de lucros.

 

Atualmente, como há a expressa intenção do Brasil de tornar-se membro efetivo da OCDE, houve a necessidade de se envidar esforços para definir os caminhos a seguir para que o regime brasileiro esteja em conformidade com os padrões internacionais.

 

Os resultados foram alarmantes, porque as lacunas e divergências encontradas levam a casos de dupla tributação e a ocorrência da erosão da base de cálculo, levando à perda de receita tributária. O sistema existente favorece algumas categorias de contribuintes em detrimento de outros e também dá margem ao planejamento tributário inidôneo. Do ponto de vista doméstico, a aparente simplicidade no sistema de preços de transferência brasileiro agrada, mas prevalece uma preocupante incerteza jurídica significativa é observada no âmbito

Internacional, fator que afugenta os potenciais investidores.

 

Falta ao Brasil aderir aos instrumentos mais relevantes da OCDE, tais como a Recomendação do Conselho da OCDE sobre a determinação do preço de transferência entre empresas associadas e futuras recomendações do BEPS. Falta também a reafirmação do Princípio do Arms Length na legislação doméstica, com relação ao âmbito de aplicação das regras de preço de transferência, além do que, não há liberdade de seleção do método de preços de transferência. Não é permitida a utilização de métodos diversos, que possam melhor averiguar a idoneidade das operações, ademais, estão ausentes na legislação brasileira o método “TNMM” (Transactional Net Margin Method) e o método “Profit Split”. O “TNMM”, basicamente, adota o lucro de uma empresa do setor em determinada transação como parâmetro para os ajustes de preços de transferência e o “Profit Split”, um tanto mais complicado, explicando de uma forma resumida, estabelece que deve ser feita a alocação do lucro de acordo diversas variáveis, relativamente aos riscos e funções das partes nas operações em uma transação, podendo assim, atribuir de forma proporcional os lucros de acordo com a participação de cada um.

 

Entre os problemas também foram apresentadas as questões de comparabilidade. O modelo brasileiro peca pela ausência da noção de delineação precisa da transação efetiva e pelo uso de margens fixas, que não levam a resultados compatíveis com o Princípio do Arm’s Length. Também inexiste uma análise de comparabilidade completa, sendo restrito o uso de comparáveis, além do que a aplicação rigorosa da abordagem item por item, não permite a combinação de transações e os ajustes de comparabilidade são limitados.

 

Dentre as considerações especiais sobre o mecanismo de preço de transferência brasileiro, podemos destacar que há fragilidade nas regras de “Safe Harbour”, ausência de definição de intangíveis para fins de preços de transferência, ausência de regras de preços de transferência ou medidas especiais para intangíveis, incluindo intangíveis de difícil valoração, tratamento dos pagamentos de royalties ao exterior (dedutibilidade limitada), ausência do teste do benefício (benefit test) para fins de preços de transferência, ausência de considerações especiais para se estabelecer o preço arm’s length para serviço intragrupo, ausência de abordagem simplificada para serviços de baixo valor agregado, regulação limitada dos acordos de contribuição de custos, ausência de considerações especiais para os aspectos de preços de transferência das reestruturações de negócios e ausência de considerações especiais para os aspectos de preços de transferência das transações financeiras.

 

Há também fragilidades relacionadas às práticas de conformidade de preços de transferência e com os requisitos de documentação limitados e multas relacionadas.

 

Estão ausentes os acordos de precificação antecipada (advance pricing arrangements), bem como, demonstra-se inabilidade de prevenção da dupla tributação.

 

Além disso tudo, sobre a determinação dos lucros dos estabelecimentos permanentes, não há regras para atribuição de lucros, além de haver pendências sobre questões relacionadas às regras de nexo.

 

O estudo realizado demonstrou-se completo e capaz de identificar as principais questões a serem enfrentadas para o desenvolvimento de um sistema de preços de transferência em plena concordância com os padrões exigidos pela OCDE, o que é muito positivo, porque tornam-se claros os desafios a enfrentar e se evidenciam as formas de resolução dos problemas necessárias.

 

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